Talvez
Quintus Sertorius tenha passado por aqui e estacionado a quadriga onde eu também estaciono hoje o carro, talvez tenha mergulhado nas límpidas águas do rio Coina e talvez por essas águas serem boas, tenha havido a ideia de designar o local como
Equabona. Mais tarde derivou para Coina e assim se mantem.
O rio, esse, continua a nascer na serra da Arrábida, cruza com a ribeira do mesmo nome e acaba fétido de esgoto no abraço com o Tejo.
Coina tem a sua história ligada a Azeitão até porque não são assim tão distantes e em 1516, quando recebeu foral da mão de D. Manuel I, o rio era navegável e assim se manteve por quase três séculos. Estaleiros de caravelas e naus e a real fábrica de vidro eram as
start-up da altura. Pelo rio, vinha também Constança -a legítima de D.Pedro e que traria a outra paixão a bordo: Inês de Castro- apanhar os ares frescos da serra na sua quinta de verão em Azeitão. Rima e é verdade.
De volta aos dias de hoje, Coina, é uma dor d'alma: descaracterizada, arruinada e mal arrumada. De resto, como Azeitão se está a tornar também desde há uma década.
De facto, terá existido um castelo em Coina -ou nas imediações- totalmente destruído, séculos atrás, nunca foi reconstruído. Mas o outro 'castelo' que bem podia ser o
ex-libris de Coina se conservado, é na realidade uma casa apalaçada inacabada, que quase liga, em estilo, ao logotipo das águas Pizões-Moura, embora nada exista de relação comercial ou outra.
É na propriedade rural de Joaquim de Pina Manique (sim, irmão do outro: o Intendente), que em 1910 Manuel Martins Gomes Júnior, ateu, republicano, político, homem de negócios, talvez maçon e também conhecido como 'rei do lixo' e não necessariamente por esta ordem, resolve construir um palácio. Nunca o acabou. Projecto insólito e vanguardista para a época talvez se destinasse a residência permanente, outros, dizem que talvez fosse a nova sede de sociedade maçonica já que a planta indiciava esse traço e o interior algo labiríntico. Até aos anos 40, mal ou bem, lá se foi aguentando a Quinta de S.Vicente ou do Manique. A partir daí começa o declínio até ir parar a outro 'rei' dos anos 70: o da construção civil, A.Xavier de Lima.
Parece que por lá continua.
Continua também a degradação do edifício, e todo um conjunto habitacional e industrial, aparentemente já fora da propriedade, com um enquadramento único bem perto do rio.
Não sei se esperam a derrocada final, se esperam a aprovação para um qualquer condomínio privado de nome reluzente tipo '
Coutadas de Coina' (inventei agora; nada de preocupações, Xavier) a exemplo do que já está em marcha, com o subsquente abate de uma extensa área de pinheiros, junto a Azeitão, para construção de um edifício da Misericórdia, que, por certo, e à boa maneira portuga da construção civil, fará a 'limpeza' integral do terreno, abatendo árvores de grande porte que poderiam certamente coexistir, para depois plantarem uma dúzia de 'fast-growing' que, por norma, na zona, secam ao fim de dois anos.
Fizeste bem, Sertorius, em viver nessa época: estas construções não ficam para a história.